sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Desabafo de Natal

Ando, há tanto, desencantada com o rumo que o país está a tomar. Portugal sempre foi e sempre será um pedaço enorme de mim, que me enche de afetos, e que costumava trazer-me satisfação, e orgulho da minha escolha de estar cá. 
Vim para estudar, atrás do jovem sonho de viver novas experiências e sair da caixa. Assim o fiz, e posso dizer que vivi imenso e intensamente cada oportunidade que me apareceu à frente. Fiz amizades lindas, descobri novas formas de festejar e estar na vida. Andei por muitos pedacinhos desta terra, e aprendi a apreciar a beleza de ter as 4 estações do ano, de verdade e por inteiro. Com cada imagem que nos apresentam...com cada colorir que se renova. Hoje gosto tanto deste "relógio" da natureza, que penso já não conseguir viver sem.

Mas agora o frio chega tão profundamente, que faz-me pensar...Estamos quase no natal, e esta, que sempre foi uma altura de enorme alegria, agora tem um certo toque que amarga. É...ao menos para mim, o natal tem tido um sentido diferente. Sempre foi um momento de dar graças, querer o bem. De meditar sobre os cantinhos do mundo, e sobre quais seriam os seus contextos nesta quadra. Mas fazia isto com o coração preenchido de vermelho, iluminado com mil e uma luzinhas piscantes e coloridas. Agora, já não é assim. Penso mais acastanhado, escurecido...sinto mais. E a desilusão é maior e mais funda.

Tenho pensado no futuro, no que me aguarda pela frente. No futuro da minha amada M., da minha família...e no futuro do lugar que escolhi para viver e construir o meu ninho. Protegido, seguro. Sinto-me então, ameaçada pelo natal. Simplesmente, porque ele me faz pensar. Mas sei, na perfeição, que a minha ameaça é outra...e é a mesma que assombra todo o país.
Quantas crianças não terão o natal que merecem? Quantos pais vão descobrir o sentimento de impotência, a pensar que estão a falhar? Quantos vão se sentir pequenos? Afogados na desilusão de um país que só tem perdido uma batalha a seguir à outra...

Sou uma otimista incurável, e ver o lado belo da vida é algo que não consigo contrariar. Quem me conhece, sabe bem que diante das pedras, eu vejo as flores que estão a seguir. Mas tenho tido alguma dificuldade em manter este espírito. Talvez seja um efeito colateral da maturidade, não sei. Mas talvez não. Penso que estão a tirar-me a esperança e a capacidade de admirar. Coisa que não tem perdão possível.

Tenho tecido, interiormente, um manto de planos. São tantos...! Cada um deles, é como um retalho de pano achado dentro de mim, e tem a sua beleza e os seus tons. Cada um deles se complementa e não pode existir em solidão. Um inspira o outro...que inspira outro, e outro, e outro. Vasculho e dou uma sacudidela às minha ideias, lembranças, amores. E assim, surgem os planos de algodão, cetim, chita. Alguns se criam, outros se recriam, e assim vou tecendo, tecendo...assim, na ficção, na imaginação. Porque a verdade dos fatos, é que vivo num atelier sem estrutura, desmoronando. Um lugar que começa a ser abandonado, porque não dá retorno aos que nele trabalham. Um lugar que parece sem luz.
Este mesmo atelier, já foi diferente. Tinha crianças a brincar, pais traquilos que as criavam, velhinhos e velhinhas, que sentados em cadeiras de balanço, bordavam e bordavam, na certeza do reconhecimento de uma vida.

Mas um dia, chegou um circo à esta terra. Diferente dos outros. Grandioso, com palhaços educados, que sorriam e chamavam para o espetáculo. O povo, cansado dos mesmos (bobos) palhaços e das palhaçadas que nada traziam de novo, entrou na fila, comprou bilhete, fez propaganda. Queriam ver coelhos a sair da cartola, e lobos em pele de cordeiros. Prometiam até o Gasparzinho. Pois bem...foi neste dia, que o atelier desmoronou, entristeceu. Baixou as persianas e encostou as portas.
Foi neste dia, que muitos sonhos enterraram-se dentro de nós. Foi neste dia que deixei de ter o direito de alinhavar os meus pedaços de retalhos, os meus planos.

Não se sabe bem o porque, e pelas ruas há confusão e desentendimento. Há balbúrdia. Há pobreza. Há gente infeliz e desacreditada. E o coelho continua a sair da cartola.
Agora, só se  pergunta por aí quando é que o circo vai embora. Mas, minha gente, o circo veio para ficar.
"Até quando, até quando, até quando..."
Sabem...é a primeira vez que vejo um circo que não condiz com o natal...

(Desculpem o desabafo! Sei que o cantinho é da M. , mas também é da mamã aqui...)

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3 comentários:

  1. :-( adorei essa sinceridade!! Infelizmente é o mundo que estamos a viver... bjs

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  2. Oh, querida...obrigada! :) foi um desabafo necessário...estava-me a sair por todos os lados... beijinhos

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  3. Minha querida menina, que já é mãe. Gostei de ouvir suas palavras de desabafo.
    São o espelho do que as pessoas desse País estão a passar. Desilusão, porque o espetáculo prometido pela nova troupe não foi o esperado.
    Sofrido, porque pessoas da sua idade estão desencantadas da vida, algumas até sem o sustento das suas famílias, e uma grande parcela que chegou agora no mercado de trabalho e encontrou portas fechadas.
    Mas tente não se desiludir, minha pequena. Ligue uma lanterna na popa do seu barco e veja tudo o que já conseguiu, os amigos que fez, a família que constituiu, a filhinha que teve, etc.
    A experiência que acumulou nesses anos, ninguém tira de você.
    Olhe para a frente, mas olhe, e dê passos curtos, para sentir o terreno e não tropeçar. São tempos difíceis, mas tenho a esperança de que você terá a sabedoria de trilhar o melhor caminho.
    Do seu pai, que a ama muito. Bjo,

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